Juvenal Rodrigues
Juvenal Rodrigues
As velhas e estreitas ruas da baixa eram calcorreadas a pé , particularmente, a Rua de Santa Maria que quando chovia muito ficava inundada e a malta jovem arrancava as tampas das malas que havia em casa para fazer um “barco” a fim de passear nas águas da chuva e atravessar a rua.
Talvez por influência de Maximiano de Sousa, o alfaiate que virou cantor de fado e música popular, nascido no Funchal em Janeiro de 1918, mais conhecido pelo nome artístico Max, esta freguesia foi das primeiras a cultivar a tradição fadista na “zona velha” da nossa cidade onde muitos deram asas ao sonho de cantar o fado no extinto “Marcelino. Em 2018 a Câmara Municipal do Funchal fez, finalmente, uma justa homenagem ao Max que levou o nome de Portugal, da Madeira em particular, além fronteiras.
O velhinho e saudoso campo do “Almirante Reis” onde muitos miúdos se iniciaram na prática do futebol e mais tarde ingressaram no Marítimo, Nacional e União.
Nessas tardes de futebol, fosse juvenil, amador ou veterano, a azáfama era enorme já que miúdos e graúdos montavam bancadas improvisadas assentes em cestos de vindima que serviam para acartar areia . Os (poucos) vendedores aproveitavam essas tardes de futebol – qual campeonato do Mundo- para vender, sobretudo, tremoços, pepinos descascados com sal fino, “sesões” e sorvetes.
As bicicletas alugadas no Armando ziguezagueavam entre os burros do Moleiro carregados com sacas de areia para a construção civil e entre os homens do mar que atravessavam o recinto e, de vez em quando, aplicavam uns “carrolaços” aos condutores que iam de encontro a eles.
Os “bamboteiros” que ora montavam “bancas de rua” ora iam em canoas a bordo dos barcos de cruzeiro para venderam o famoso bordado da Madeira aos estrangeiros, mexiam com o rudimentar comércio local. Os miúdos da “mergulhança”, que acompanhavam os adultos a venderem os bordados, também eles aproveitavam para fazer o seu “negócio” acercando-se dos navios e proporcionando um espetáculo aos turistas que consistia em pedir que lhes atirasse uma moeda e estes, por sua vez, atiravam-se ao mar para recupera-la para gáudio dos espetadores. Muitas vezes escondiam as moedas na boca e faziam sinal que não as tinham apanhado a ver se “chovia” mais moedas e assim conseguiam enganar os estrangeiros aumentando o lucro em mais um “pence”.
Os pescadores da zona que se aventuravam em pequenas embarcações na pesca do atum vinham descarrega-lo na velha Lota do Almirante Reis atraindo a pequenada que ajudava a varar o barco e eram recompensados com buchos, corações de atum ou chicharros mediante o olhar guloso de um bando de gaivotas que sobrevoavam o calhau brigando por um quinhão.
Os velhos homens das lides do mar, quer da faina da pesca quer da extração de areia, quando o mar batia forte no calhau e os impedia de trabalhar passavam as tardes as jogar às cartas ou às damas, riscadas sobre o muro com um giz ou simples bocados de telha vermelha.
A velha “Barreirinha”, agora moderno complexo balnear, possuía um ringue delimitado por cordas de amarração onde alguns, armados em Cassius Clay, praticavam boxe para chamar a atenção das “miudas.
As “peladinhas” de bola ajudavam malta a aquecer o corpo nas manhãs frias de inverno após um mergulho de uma prancha de uma torre com 6 metros de altura, havendo até alguns mais afoitos que se atiravam, com a maré cheia, do cimo da rocha.
Muito haveria para contar dos usos e costumes desta velha Freguesia mas, por limitação de espaço, apenas vou referir o Forte de Santiago, um ex-libris da Freguesia de Santa Maria Maior, junto à pequena praia com o mesmo nome. Este forte já foi sede da PM (Polícia Militar) pós revolução do 25 de Abril de 1974 e também sede da “Liga dos Combatentes, embora hoje esteja apenas vocacionada para restauração, festas e exposições.
As historias do nosso passado e das nossas tradições culturais poderão não encher o estômago mas encherão, certamente, o espírito das gerações vindouras.