Isabel Freitas
Isabel Freitas
Aqui sentada na minha varanda, contemplo a minha jovem plumeria cujas folhas já estão imponentes e dia-menos-dia, as tão desejadas flores cor de leite irão desabrochar. Gosto tanto desta planta, em especial do seu cheiro!
Quando me a ofereceram aceitei logo mas longe de imaginar a felicidade que aquele ser me iria trazer. Nada é por acaso…
Este ano, mal apareçam, repetirei o meu ritual secreto que agora deixa de o ser, em que me agacho, fecho os olhos e inalo profundamente o seu aroma, exercitando a minha mente em busca de memórias e sensações do passado. Este fantástico cheiro transporta-me até à minha infância, ao quintal da minha avó, à plumeria enorme que lá existia e que sempre fez parte da minha vida! Engraçado, não é, olhar para trás e perceber a importância de uma planta e o seu aroma na caminhada de uma pessoa?! Um cheiro do passado que me faz o coração bater mais rápido, com um apertinho de saudade.
Gostava tanto de subir para cima daquela “árvore” e me sentar em cima de um dos braços, a fingir que andava de cavalo. Inebriada por aquele cheiro, a minha mente voava e sonhava e lá entrava eu, no mundo das minhas fantasias! Aquele canteiro, de pedra de calhau rolado, que estava ali ao virar a esquina, pertinho da varanda que permitia contemplar o porto do Funchal, era muito especial, precisamente por ter aquele imponente exemplar. As fotos no meu álbum realçam a importância do mesmo, pois uma das clássicas fotografias tiradas à criançada, no carnaval e em outras alturas, era precisamente na dita cuja plumeria, onde orgulhosamente nos empoleirávamos!
Mas nem era necessário estar lá sentada para sentir aquele doce aroma. Quando estava no mirante, encavalitada ou não no muro que ficava mesmo acima da copa cheia de flores, aquele cheiro inconfundível envolvia-me de tal maneira, que hoje compreendo o conforto que me dava e a marca que me deixou. Também me recordo, de algumas vezes a minha irmã e eu, termos dores de dentes e para acalmar de imediato aquele desconforto, o meu pai colocava um algodão embebido no leite da plumeria! Aquela planta fazia parte de nós! E ao descrever estas memórias talvez se perceba a razão da existência deste desejo tão forte para que as flores rebentem e o aroma exploda e me desperte os sentidos, de modo a conseguir revisitar e reviver, dias tão felizes que tive.
Efetivamente, aquele quintal daquela casa, onde tive a sorte de crescer e passar grande parte da minha infância, estava cheio de cantinhos e recantos, todos especiais, cada um com uma história que trago gravada na alma, de momentos partilhados e alguns em solidão, onde conhecia cada canteiro, cada degrau, cada planta, associados a cheiros e a cores especiais, e até a sons inconfundíveis, como era o caso do ferro pedreiro do portão da entrada, ou da maçaneta do xadrez ou até da torneira da mangueira que deixava sair água sempre que era ligada.
Cada vez que vou ao sótão das minhas recordações e mexo nas minhas caixinhas de memórias, trazendo e abrindo algumas delas, fico absorvida e cheia de saudades destes momentos do passado, tão simples e tão bons que me enchem de felicidade…