Márcio Correia
Márcio Correia
O regresso às aulas marcou, desde sempre, a vida de todos nós, principalmente enquanto crianças, não apenas porque era nessa altura que voltávamos a estar com os nossos amigos mas também, por toda a azáfama característica daquela altura do ano.
No Porto Moniz não era diferente, e todo o processo começava sempre com uma “ida à cidade”. Saíamos bem cedinho, de forma a conseguirmos apanhar o “carro das 6”, só assim se conseguia rentabilizar todo aquele dia reservado para fazer as voltas no Funchal.
Depois de uma viagem de quase três horas de autocarro, estávamos no Funchal. Era tudo tão grande, cheio de gente e com tantos carros, um encanto! A prioridade era tirar a senha, logo de manhã, nas livrarias, só desta forma se conseguia assegurar a compra dos manuais escolares. Era uma correria, já para não mencionar a despesa de uma família com três filhos a estudar em simultâneo.
A minha mãe gostava sempre de poder dar, felizmente, uma roupinha nova, logo, mais voltas haviam a fazer. Fatinho de treino para a “ginástica” e sapatilhas novas. Era uma alegria!
Hoje, todo este processo, por força dos vários apoios na aquisição dos manuais, deixou de ser, felizmente, uma realidade para todos os estudantes do Porto Moniz, bastando-lhes uma ida à Câmara Municipal, fazer o levantamento dos manuais escolares, sem qualquer custo, independentemente da situação financeira de cada um, sem filas, e sem jornadas à cidade.
Tudo comprado, era altura de, mais perto do início das aulas, irmos em bando à escola confirmar a afixação das turmas escaladas para o ano que estava prestes a iniciar. Nessa altura já se combinava como era, no primeiro dia, a ida para a escola. Eu, que vivia na Vila do Porto Moniz, onde está localizada a escola, arrancava cedinho, e ia passando pela casa dos meus amigos, e o grupo ia sempre aumentando até chegarmos à escola. Pelo caminho, algumas paragens, entre brincadeiras, e passagens nos “poios” para roubar fruta, que muitas vezes servia já de pequeno almoço.
Tantas vezes o grupo, que ia a pé, era apanhado pela carrinha de caixa aberta do senhor Simão, que também levava os filhos à escola, e, daquela forma, levava a carroçaria cheia de canalha, numa festa simples e saudável que se repetia, todos os dias, antes das 8 da manhã, hora em que se iniciavam as aulas.
Numa contínua melhoria, hoje, o transporte é assegurado, gratuitamente, pelo Município.
Na hora de saída, só era importante estar em casa antes de anoitecer. Não haviam consolas, computadores nem sequer TV cabo! O caminho de regresso era feito pela vereda do centro de saúde, com os meus amigos do Figueiral e da “Asa-branca”, onde os barquinhos (bocadinhos de madeira entenda-se) tiravam corridas na levada enquanto ficávamos a assistir, em êxtase, àquela corrida em câmara lenta.
Muito ricas são as recordações de quem cresceu numa terra pequenina, mas com muitas vivências, tradições e riquezas. Crescer e estudar no Porto Moniz fez, com certeza, de todos nós, melhores homens e mulheres para aquilo que a sociedade esperava de nós.