Juvenal Rodrigues
Juvenal Rodrigues
Dado o papel das Juntas de Freguesia, sufragado nas urnas pelo voto da população com o fim de desempenhar o papel de poder local mais próximo da população, as Casas do Povo deixaram de fazer sentido.
As Casas do Povo foram, essencialmente, organizações corporativas de trabalho rural criadas em 1933, por decreto lei, durante o regime corporativista do Estado Novo em Portugal, sendo dotadas de personalidade jurídica e destinadas a colaborar no desenvolvimento económico-social e cultural das comunidades locais, bem como assegurar a representação dos legítimos interesses dos trabalhadores agrícolas.
Em paralelo foram criadas também as Casas dos Pescadores porque tinham um papel social preponderante.
Todavia a Lei n.º 4, de Janeiro de 1982, veio esvazia-las de personalidade jurídica, deixando-as circunscritas apenas a um papel sócio-cultural. Não obstante, algumas continuaram em Portugal continental e nos Açores, mas, na Madeira, sabe-se lá com que finalidade, estas continuaram em força, ao ponto de no passado dia 01 de Março o Governo Regional celebrar 41 contratos-programa entre a Região e as Casas do Povo no valor de 243,6 mil euros.
Sabendo que a Madeira tem 53 freguesias e o Porto Santo 1, quase que o numero de Casas do Povo é igual às Juntas de Freguesia. Para termos uma ideia das verbas envolvidas, o Governo Regional concedeu entre 2015/2017, através de contratos-programa, a módica quantia de 1.516 mil euros e ainda com a promessa de serem reforçados no futuro, quando se sabe que algumas pequenas Juntas de Freguesia democraticamente eleitas não têm dinheiro para pagar um funcionário(a) para tratar do expediente ou atender as pessoas que para elas votaram.
Se tivermos em conta que o Governo Central disponibiliza apenas cerca de 127 mil euros/ano através do FFF (fundo de financiamento de freguesias) para, por exemplo, uma freguesia como Santa Maria Maior, no Funchal, com uma população a rondar os 13 mil fregueses, este valor é manifestamente exíguo relativamente às Casas do Povo que têm um papel meramente social.
As Juntas de Freguesia e os seus órgãos dirigentes são legitimados nas urnas pelo voto universal da população, enquanto as listas de dirigentes das Casas do Povo são apenas sufragadas pelos sócios/utentes da própria instituição, logo as Juntas de Freguesia são os verdadeiros e legítimos representantes dos seus fregueses.
Receio mesmo que as Casas do Povo, hoje, estejam apenas a servir outros fins políticos e a desperdiçar dinheiros públicos na medida em que até o papel sócio-cultural das Casas do Povo foi esvaziado pelo aparecimento dos lares de terceira idade, centros de dia, centros etnográficos, centros cívicos e pelos ginásios para actividades físicas, cognitivas e recreativas que hoje, felizmente, a Madeira possui em quantidade/qualidade.
Assim sendo reafirmo que as Juntas de Freguesia podem e devem ser o poder mais próximo da população e aquelas legitimamente eleitas para resolver os seus problemas, já que as Casas do Povo, neste momento, simplesmente duplicam esse papel.
Assim sendo, é incompreensível que o Governo Regional, em vez de canalizar dinheiros públicos para as Casas do Povo, porque não atribui essas verbas às Juntas de Freguesia? Para quê duplicar o papel social de dois organismos que têm os mesmos objetivos? As Juntas de Freguesia têm contabilidade organizada, respondem perante a Assembleia de Freguesia e ainda perante o Tribunal de Contas enquanto as Casas do Povo, como entidade equiparada a IPSS (Instituições Particulares Solidariedade Social) apenas são fiscalizadas pela tutela, e a tutela é precisamente o Governo Regional que chegou ao cúmulo de atribuir 25% aos intermediários (entenda-se Casas do Povo) por cada 100€ atribuídos aos fruticultores (Resolução 93/2018 de 22 Fevereiro, artigo 6A n.º2 do JORAM).
As contas das Casas do Povo são pouco ou nada conhecidas dos contribuintes e estes têm o direito de saber se o dinheiro dos seus impostos foi ou não bem aplicado e ainda se os seus dirigentes são remunerados, porque se assim for é também duplicação de verbas canalizadas para salários. A Madeira esteve muitos anos a gastar dinheiro na ‘compra’ de votos e, com tantas carências sociais, não pode continuar a gerir mal recursos financeiros que nos fazem falta para necessidades prementes.