Cristina Silva
Cristina Silva
“António, ao partir, levou p’ra guerra,
Um pombo-correio encantador,
Para mandar notícias lá da terra,
À sua noiva amada Leonor.
Na hora da partida, um juramento,
Jurou ser-lhe fiel até à morte,
E numa despedida de tormento,
Ela disse a chorar: Deus te dê sorte!”
Este é um breve trecho de uns “versos” que o meu Avô me costumava cantar, na minha infância, nas tardes de domingo, e fazia-o, com tanto entusiasmo, que parecia que estava a viver aquela história, naquele momento.
Eram essas histórias simples, contadas em família, que preenchiam as longas noites da infância de muitos dos nossos Avós, numa época em que a ausência de energia eléctrica alimentava a crença em feiticeiras, que se manifestavam através de ruídos estridentes, de tranças deixadas nas “canas-vieiras” e de luzinhas que o medo da escuridão e silêncio da noite deixava avistar nas serras do Campanário.
É à infância de outros tempos e à velhice dos tempos modernos que dedico o texto de hoje.
À semelhança do que sucede nas demais freguesias da Madeira, o Campanário não é excepção, no que respeita ao número expressivo de pessoas idosas que constituem a população da freguesia.
Pela sua dimensão e pela especial vulnerabilidade que lhe está associada, a comunidade sénior tem merecido, ao longo dos anos, uma atenção redobrada, por parte de várias instituições, como sejam, designadamente, a Paróquia, a Junta de Freguesia, o Centro de Dia, bem como, a Casa do Povo que disponibiliza, entre outras actividades, uma panóplia de “cursos”, desde culinária, pintura, bordado, teatro, música, … promovendo, assim, a valorização de vários tipos de arte e o reconhecimento dos respectivos autores, até então, anónimos.
É igualmente merecedor de destaque, o trabalho que tem vindo a ser desenvolvido pela Adbrava – Associação de Desenvolvimento da Ribeira Brava e, também, pela ADC – Associação Desportiva de Campanário que, desde a sua fundação, em 1997, vem envolvendo toda a comunidade nas inúmeras actividades culturais, desportivas e recreativas que promove e que permitem “aos menos jovens”, em especial, a possibilidade de viverem na velhice a infância que a Vida lhes roubou.
E se há os resistentes, “daquele tempo”, que não vão em modernices, outros, ainda que envergonhados, preferem render-se às novidades que “os tempos modernos” trouxeram, contrariando, assim, o relógio que teima em não parar e a idade que não perdoa.
E lá vão elas e eles, vestidos a rigor, para a Associação Desportiva, para a sua aula de ginástica ou de natação, para a caminhada ou passeio ao museu ou ao jardim que nunca imaginaram visitar, para uma noite de fados na zona velha da cidade ou, até, para uma – até então – impensável participação num desfile de moda, onde serão o centro das atenções na passerelle.
E, com esta vitalidade e alegria contagiantes, passam os dias como se voltassem a ser meninas e meninos, cheios de entusiasmo, com objectivos a cada amanhecer, mostrando que não desistem nem esmorecem perante a assustadora solidão e os limites do tempo.
Estes são, pois, alguns exemplos daquilo que a freguesia do Campanário oferece aos Pais que ocuparam a sua infância com o trabalho árduo e às Mães que dedicaram a sua juventude à “lida da casa” e à família, as mesmas que, ainda hoje, cuidam, com uma doçura que só as Avós têm, dos nossos filhos.
Dedicar algum do nosso tempo aos mais velhos, reconhecendo a sabedoria que os anos lhes deu, mais do que dignificar a sua história e o seu passado, é respeitar o nosso futuro, pois são eles o reflexo daquilo que seremos um dia e da forma como gostaremos de ser tratados.