Jaime Gomes
Jaime Gomes
Era eu ainda apenas uma criança, a caminho da escola primária, mas é impossível esquecer umas das regras ditadas pela minha mãe: “ Cumprimentar as pessoas que encontres no teu caminho para a escola” e claro na altura, o mais sensato era cumprir, não fosse eu mais tarde ter de me justificar.
Agora olhando para trás entendo que tive a felicidade de puder construir a minha identidade num caminho cheio de bons conselhos e de bons exemplos. E acho que no meio destas vivências, e respeito pelo próximo, fosse ele quem fosse, aprendi desde muito novo a olhar para além do meu próprio umbigo e daquilo que eu achava importante, mesmo sendo filho único, mas com muitos irmãos emprestados.
Na minha juventude não se falava muito em voluntariado, ou sequer na visibilidade social ou política do mesmo, não pelo menos no sentido que hoje tem. Ensinaram me assim, era para fazer e alguém tinha de o fazer, então vamos embora meter mãos à obra. Era para limpar, pois então vamos embora limpar. Lembro-me que esperávamos por esses momentos para estarmos todos juntos e fazer qualquer coisa de diferente e quem sabe poder chegar a casa um pouco mais tarde. Sendo da Ponta Delgada é difícil esquecer a excitação que o Arraial nos causava, por todas as coisas que era necessário fazer, ir à murta, por as varas, enfeitar, tantas coisas…que davam sabor a esses dias, e que ao mesmo tempo permitiam o convívio um pouco até mais tarde, e às vezes com sorte até de madrugada.
Este espírito de voluntariado e de trabalho pelo bem comum já quase não existe, ou pelo menos resume-se a muito pouco. As justificações são quase sempre as mesmas, não há pessoas, as pessoas não têm tempo, são muito ocupadas. É verdade que muitos se escusam de participar porque ou acham que não contribuem com nada de válido ou porque não se querem aborrecer, ou mesmo como tenho ouvido tantas vezes, vocês estão a fazer um bom trabalho! Muitas vezes também quem está à frente das entidades não tem abertura suficiente para saber e entender esta realidade e conseguir dar a volta a estas situações. É necessário que haja uma aproximação das pessoas, e uma política de porta aberta, de transparência.
Num momento, de poucos recursos financeiros disponíveis, o rumo tem que ser o essencial, e deve ser acima de tudo diferenciador. Não nos deixemos perder numa multiplicação de atividades, de interesse por vezes duvidoso e quase sempre de público reduzido. Colidindo muitas vezes com o vizinho do lado, numa estratégia de tudo querer fazer, primeiro que os outros e mais depressa. De que serviria por exemplo, uma entidade querer fazer uma nova atividade se ao lado a mesma atividade é desenvolvida por outros ali mesmo ao lado?
É um facto que sem os financiamentos públicos, seria de todo impossível levar a cabo qualquer atividade. Esta dependência do financiamento público é preocupante, e coloca-nos uma questão?
Que sustentabilidade podemos e queremos dar às associações que muitas vezes refugiando-se no estatuto de entidades privadas dependem a 100% do dinheiro público? É de facto uma realidade transversal. E contra mim próprio falo, eu também sou dirigente de uma associação que depende exclusivamente de financiamento público. Gostava que assim não fosse, até porque compreendo a dificuldade, por exemplo do município em dividir um bolo que por si só já é pequeno e ao mesmo tempo ter em conta realidades tão diversas e objetivos por vezes pouco claros.
Um concelho desenvolvido, com atividade desportiva, cultural e social é indissociável de um trabalho conjunto de concertação de esforços entre entidades públicas e privadas. E de uma forma geral as associações têm sabido corresponder ao que o Município de São Vicente solicita. Aproveito para louvar publicamente a disponibilidade sempre manifestada pelo executivo camarário em acolher todas as atividades, em ouvir inúmeras ideias, e apoiar sempre que lhes é financeiramente possível, obrigado!
Por mim, gostaria de caminhar para um outro modelo de sustentabilidade, que aliviasse um pouco as responsabilidades que imputamos ao sector público, consciente de que esse cenário nunca será total ou que seja um caminho fácil. Consciente também, que para que este cenário fosse possível teria de existir uma transferência de responsabilidades financeiras quer para quem usufrui, quer para os possíveis parceiros privados, dando-lhes a responsabilidade financeira e social que efetivamente têm. Cabe também ao associativismo e seus dirigentes a responsabilidade de procurar condições para aumentar a autonomia financeira de cada um, não sendo fácil será certamente num futuro não muito distante, o caminho a seguir.
A freguesia da Ponta Delgada possui hoje uma oferta aos residentes e visitantes de qualidade quer seja informativa/formativa e de ocupação dos tempos livres desde os mais jovens ao menos jovens. Fruto de um trabalho de continuidade e persistência. Temos de estar conscientes de que enfrentamos uma forte concorrência exterior ao concelho e não sendo isto justo, é a realidade, por isso, acho que interessa aprender a fazer diferente e assente numa estratégia de salientar a identidade única e particular da freguesia Ponta Delgada e concelho São Vicente.