Manuel Vieira de Sousa
Manuel Vieira de Sousa
O Loreto que conheci na minha infância tinha uma referência única no meu imaginário: uma dezena de plátanos e carvalhos plantados no eixo da então Estrada Nacional 101 que atravessava a baixa do Loreto.
Sim, a baixa do Loreto, porque era ali que estavam a capela, 2 escolas primárias, a masculina e a feminina, a praça de táxis, além das mercearias e bares que também serviam de representantes de diversos bancos. Era aí que se trocavam a maior parte dos cheques com que os nossos emigrantes amenizavam a espinhosa vida dos que aqui sobreviviam.
O meu bairrismo e amor pela terra que me viu crescer levou a que o identificasse como sendo o único local ocidental da ilha com uma avenida. De facto, este troço de estrada tinha, ao meio, centenários carvalhos e plátanos. Já foram muitos mais.
O certo é que os poucos automóveis existentes parqueavam entre as árvores. Assim facilitavam o trânsito e evitavam acidentes com algum acelera mais atrevido ou distraído.
Corria a segunda metade da década de 70 do século passado, quando soube dum abaixo-assinado, encabeçado por industriais de transportes, que circulava com um pedido ao governo regional para abater as árvores porque dificultavam a circulação dos automóveis, sobretudo dos camiões.
Dei início a outro abaixo-assinado, com o objectivo contrário, dirigido ao então Presidente do Governo Regional, Dr. Alberto João, onde pedia que não fossem retiradas as árvores, pois aquele arvoredo era a uma referência única. Era a alma do Loreto. E uma referência única. E ainda continua a ser no subconsciente de muita gente. Felizmente, o pedido da manutenção do arvoredo foi acatado. As árvores foram sendo abatidas, face à insegurança que algumas delas foram apresentando.
Hoje apenas conta com quatro no eixo e um junto à casa paroquial e, entretanto, outro bem mais recente, foi plantado na entrada do Caminho Municipal do Massapês.
Ora, já muitos anos depois, e já com poucos carvalhos, houve um comissário da PSP que se incomodava muito com os automóveis parqueados no eixo da estrada.
– Sr. Comissário, porque essa sua obsessão contra o estacionamento do Loreto?
– Porque é o único sítio do mundo, onde vi estacionar a meio da estrada.
Aí, de facto, dei-me de conta que, para nós frequentadores habituais do Loreto, ainda estávamos a estacionar entre as “placas do Loreto”. Só que elas apenas existiam no nosso imaginário.
Foi, no dia 12 de Abril de 1974, sexta-feira santa, que dentro do Porsche do meu amigo Celestino, os dois começámos a delinear uma produção de panfletos contra as atitudes e desmandos do então presidente da Câmara para serem deixados, clandestinamente, pelas capelas e igrejas do concelho. Felizmente, outros factos resolveram o problema…
Bem recentemente, o primeiro carvalho, no sentido oeste-leste, tornou-se o último a cair às fitas duma qualquer motosserra. De facto, o tronco estava carcomido e, no seu último Natal, a caverna existente serviu para acomodar um “presépio”. Seria o primeiro a cair nos anos 70 do século passado. Ainda aguentou mais quarenta anos.
Enfim, bairrismos à parte, apenas gostaria de ver os responsáveis locais empenhados em preencher aquele eixo central com mais algumas árvores.
Vamos compor o ramalhete do Loreto?