Mara de Sousa Freitas
Mara de Sousa Freitas
– Bom dia Sol! – Adeus Lua!
– Cantou e sorriu, alegremente, a menina da minha aldeia, ao acordar.
Os dias, lá no alto da minha aldeia, começam tímidos, inseguros, instáveis, quase fazendo acreditar que serão apenas isso, mais um dia. Os sábios da nossa aldeia, que permanecem na nossa casa, ensinaram-nos que o tempo é sábio e o único capaz de verdadeiras revelações. É preciso saber esperar, escutar, sentir, apreciar com serenidade, humildade e amor. É preciso demorar-se para poder habitar a nossa casa.
Na nossa aldeia, os anos habituaram-nos a receber a neblina matinal com um sorriso envergonhado, um olhar curioso e um sentimento singular de grandeza [afinal a nossa aldeia é tão grande]. O véu branco, que cobre o rosto belo da nossa aldeia, esconde a surpresa, o espanto da luz que se adivinha. A brisa sopra fresca e húmida – parece entranhar-se nos corpos -, suave e delicada e faz deslizar o véu branco sobre o seu rosto, descobrindo o sublime espetáculo desta Serra com vista para o mar, para a ilha que existe em si e para a Terra que de si deixa descortinar. A nossa casa é tão misteriosa.
E, lá está! O Sol, o mar, o horizonte, a certeza que o manto da noite e o véu matinal são apenas o refúgio do simplesmente belo. Cada raio parece procurar colorir e aquecer os recantos mais sombrios, enevoados, frios. Abraçam e envolvem as nuvens, mesmo as que teimam em manter-se cinzentas, veem-se, paulatinamente, transformar numa prata reluzente, que também ilumina.
O ouro sobre o azul acabam por pintar a tela, que se avista da janela da nossa aldeia, da nossa casa, aquele lugar eterno – já vos tinha contado este segredo – onde está o nosso coração. Sim, a janela da nossa casa, esse espaço fascinante e secreto, que expõe, fragiliza e constrói. Esse lugar misterioso, por onde a menina que vive na minha aldeia espreita, diariamente; se demora a olhar para a lua; procura as estrelas; contempla o mundo; olha o infinito no horizonte e recebe deste a viagem para os seus sonhos.
A minha aldeia invade a nossa casa e enfrenta-a por esta janela, ora aberta, ora semiaberta, ora fechada e a menina estará, sempre, à janela, da nossa casa.
É tão bom estar na nossa casa, diante da nossa aldeia, dos nossos sonhos, dos medos, estar connosco e diante deste mundo maravilhoso, que, permanentemente, nos desafia e constrange. É tão bom habitar a nossa casa e nela (re) visitar-se a cada instante. É tão bom! – Segredou a menina da minha aldeia, à janela da nossa casa, contemplando os verdes campos, sentindo a brisa suave no seu rosto, escutando os pinheiros a dançar ao som do vento e deixando que cada raio de Sol aquecesse a sua alma.