A estrada segue sinuosa por entre montes verdejantes, rasgando a encosta com curvas que revelam, a cada quilómetro, paisagens de cortar a respiração. À medida que nos aproximamos da costa Norte da ilha da Madeira, o cheiro a mar torna-se mais presente, e o som das ondas a rebentar contra as rochas anuncia a chegada a um lugar onde a natureza parece ter esculpido cada detalhe. Chegamos finalmente à freguesia do Porto Moniz, um dos recantos mais emblemáticos da ilha. As ruas conduzem-nos até ao ‘ex libris’ do concelho, as famosas piscinas naturais vulcânicas. Mas a freguesia é muito mais do que o seu postal mais conhecido. O Porto Moniz estende-se entre o mar e a serra. Cada um dos 13 sítios guardam rostos, tradições e memórias que resistem ao tempo.
A visita acontece em plena Semana do Mar, a maior festa do concelho, que enche as ruas de gente, de música e de gastronomia típica madeirense.
À conversa com quem vive na freguesia, a opinião de que o Porto Moniz é visto como “um cantinho do céu” é quase unânime, sendo que, nas palavras do povo, “não falta nada”. Mas basta ouvir com atenção para perceber que, por detrás do orgulho, há inquietações. A partida dos mais jovens em busca de oportunidades fora da localidade é um sinal claro de que falta emprego qualificado, o que coloca em causa a renovação geracional. E se a paisagem continua imponente e o turismo dá algum alento, a escassez de oportunidades e o envelhecimento da população deixam antever que, por mais bonito que seja o postal, é preciso mais.
Para Adelino Silva, proprietário do restaurante Atlântico, na freguesia “vive-se bem”. O Porto Moniz, descreve, “é bonito e, para quem quer ficar, fazer família, tem de tudo o que é preciso: o mar, a serra, escola até ao 12.º ano, o clube desportivo, o centro de saúde, finanças, registo, cartório, tudo. A freguesia está completa do melhor que existe”, garante.
O empresário destaca o bom momento vivido no turismo.
“Recebemos milhares de turistas diariamente. Agora, até temos um leque muito mais alargado. Após o covid-19, estamos talvez num dos melhores anos de turismo, com pessoas do Mundo todo.”
O comerciante rasga elogios à terra onde escolheu fazer vida.
“A gente aqui somos iguais que a Roma. Vir à Madeira, não ver o Porto Moniz, fazer uma visita às piscinas, é igual que ir a Roma e não ver o Papa.”
Adelino Silva reconhece, por outro lado, que nem tudo é um mar de rosas, apontando para a dificuldade em reter os mais jovens. “Isso é muito difícil. Infelizmente, só temos a câmara, a hotelaria e a restauração…, mas a verdade é que para empregar os jovens no turismo, às vezes, é muito difícil. Cada um tem o seu sonho.” Para inverter a tendência, o empresário defende incentivos à formação e à integração no sector turístico da freguesia.
Outro desafio apontado é a escassez de mão-de-obra: “É muito complicado. Com tantos negócios a crescer e a população curta, é normal. Quem aparece para trabalhar são mais os imigrantes, por exemplo, da Venezuela, porque, realmente, os locais vão à procura de outras áreas.”
Ernesto Macedo, cantor e proprietário do Talho da Santa, chegou ao Porto Moniz, a terra natal da sua mulher, há sete anos, proveniente da Venezuela. O início, constata, “foi difícil”, mas a vida agora “corre bem”, na freguesia que considera ser “um cantinho do céu”.
O empresário confirma a importância da comunidade imigrante, afirmando que “se não fossem os venezuelanos, a maioria dos restaurantes estavam fechados, porque o pessoal para trabalhar é pouco”, já que os jovens “querem estudar e sair da freguesia, não querem trabalhar na hotelaria e na restauração”.
A dificuldade aperta quando questionado sobre o que falta na freguesia: “O trabalho aos poucos está sendo feito. O Porto Moniz tem crescido a olhos vistos. Sempre vão faltar coisas, mas eu não sei dizer o que falta, para mim tem de tudo. Temos transporte suficiente, educação, saúde, o Centro de Saúde trabalha as 24 horas… Tudo para viver bem.” Enquanto cantor, diz nunca ter imaginado “tamanha aceitação das pessoas”, destacando que o apoio local “é muito importante”.
Também Sérgio Correia, presidente do Clube Desportivo e Cultural do Porto Moniz e tripulante da embarcação de salvamento do SANAS, reforça a ideia de que a freguesia é um lugar privilegiado: “O Porto Moniz é um cantinho do céu, não há melhor do que isto. Praticamente tudo é resolvido cá.”
O responsável pelo clube local reconhece transformações na vida da freguesia com a vinda de turistas mais jovens, contrariando a tendência antiga de um turismo mais idoso. Além disso, o regresso de emigrantes e a chegada de imigrantes tem dinamizado o comércio e os serviços da localidade.
O maior desafio para Sérgio Correia é a falta de crianças no clube, que aos poucos tem sido colmatada pela comunidade venezuelana. O objectivo agora é atrair crianças de outras localidades da Região, já que “chegar ao Porto Moniz hoje é fácil”.
O reformado Luís Alberto Correia analisa de forma simples e prática a vida no Porto Moniz, enaltecendo o trabalho feito pelo actual executivo da Câmara Municipal: “Ora, a vida para quem tem dinheiro é boa. Para quem tem dinheiro, não falta nada. O que falta no Porto Moniz é saúde para alguns. Eu vejo isto tudo bom. Este presidente fez alguma coisa, impecável.”
Quanto à recente polémica sobre o estacionamento, garante que “é mentira que seja tudo pago”, dando o exemplo do terreno que a câmara alugou perto do centro de saúde “para fazer estacionamento de borla”, comentando que “fica um pedacinho desviado e as pessoas não querem andar”.
“Já se sabe que as pessoas sempre têm alguma coisinha a dizer. Deus é Deus e as pessoas dizem mal de Deus”, atira.
Salestino Castro, também reformado, do sítio da Pedra Mole, não tem dúvidas de que “a vida no Porto Moniz é boa” e deixa um conselho aos mais novos: “A vida está cara, já se sabe, mas vive-se. É preciso saber viver a vida.”