Ricardo Faria
Ricardo Faria
Machico viveu nos últimos dias mais um momento histórico, da sua vasta e rica história, superiormente protagonizado pelas suas gentes locais.
A XIII edição do Mercado Quinhentista, subordinada ao tema Herdeiros de Tristão, não foi mais uma, foi sim uma grande produção que contou com 51 grupos de animação englobando 650 pessoas, ultrapassando os 200 espetáculos ao longo dos três dias. Este evento que promove a cultura do nosso povo, excelentemente organizado pela Escola Básica e Secundária de Machico, com o apoio do Governo Regional da Madeira, da Câmara Municipal de Machico e de uma panóplia de parceiros públicos e privados, orgulha todos os machiquenses como também, penso eu, todos os madeirenses. Parabéns a todos os envolvidos.
A história da freguesia de Machico é muito rica, como já sabemos. Uma das suas riquezas reside também no seu património edificado, o qual possui um valor inestimável para o seu povo como são os casos do Forte de Nossa Senhora do Amparo e o Forte de São João Baptista.
O Forte de Nossa Senhora do Amparo foi erguido em 1706 pelo Capitão Francisco Dias Franco, escrivão da Câmara de Machico, de acordo com a inscrição epigráfica sobre o portão de armas. No contexto da Guerra Civil Portuguesa (1824-1834), por ocasião do desembarque das tropas Miguelistas que visavam erradicar o Regime Liberal na Madeira em 1828, foi o último forte da ilha da Madeira a render-se às tropas de D. Miguel.
Em 1940 o imóvel foi entregue à Guarda Nacional Republicana, encontrando-se classificado como Imóvel de Interesse Público pelo Decreto nº. 30/762, de 26 de setembro de 1940. Em 1993 foi doado ao Governo Regional da Madeira, sendo entregue a sua gestão à Câmara Municipal de Machico.
O Forte de São João Baptista, também conhecido como Forte do Desembarcadouro, por erguer-se onde os primeiros colonizadores da ilha desembarcaram, foi erguido por determinação do governador e capitão-general da Madeira, Duarte Sodré Pereira, em 1708, de acordo com a inscrição epigráfica sobre o Portão de Armas. No contexto da Guerra Civil, as forças liberais na ilha fizeram fogo deste forte contra a esquadra Miguelista. Tendo “Infante D. Sebastião” respondido com fogo, o forte sofreu ligeiros danos, segundo Silva e Menezes no Elucidário Madeirense. No século XX, precisamente em 1910, as suas dependências foram utilizadas como hospital de coléricos, tendo sido erguidas casas de madeira no seu interior para esse fim. Foi classificado como Imóvel de Interesse Público pelo Decreto nº. 32/973, de 18 de agosto de 1943.
Mais tarde foi utilizado como colónia de férias das crianças do Convento de Santa Clara do Funchal. Após o 25 de abril de 1974, foram alojados retornados das ex-colónias portuguesas em África, sendo que até 2002 esteve na posse de algumas famílias de Machico, que aí viveram por mais de vinte anos.
Os dois edifícios representam, como vimos, a história de Portugal, da Madeira e de Machico. São edifícios emblemáticos que nem sempre foram tratados como tal.
O Governo Regional da Madeira em 2002, após realojar as famílias que viviam no Forte de São João Baptista, em más condições, aprovou um programa de recuperação para o mesmo, que previa espaços museológicos e de restauração, não tendo sido concretizado. Não desistindo de dar uma nova cara ao edifício, em 2005 surgiu um novo projeto para uma unidade hoteleira com quarenta quartos, não tendo também sido concluído. A crise financeira veio deitar por terra o investimento que seria privado.
Mais recentemente, e depois de ultrapassados todos os processos burocráticos que envolveram o projeto anterior, o governo lançou o anúncio da concessão de exploração do forte para “utilização de estabelecimento hoteleiro ou alojamento local, incluindo restauração e realização de quaisquer eventos sociais e culturais, assim como a utilização de caráter social”, em Diário da República, no passado dia 11 de maio. Esperemos, portanto, que seja este o passo final para a reabilitação de um dos edifícios mais emblemáticos da freguesia, acabando com aquela imagem aterradora na encosta da bela baía de Machico, indo ao encontro das reivindicações legítimas da sua população a qual anseia quase à duas décadas pela sua resolução.
Já o Forte de Nossa Senhora do Amparo após a entrega à região, com a gestão a cargo da Câmara Municipal de Machico, foi até ao ano de 2015 o posto de turismo de Machico. Nesse ano o posto de turismo foi extinto do local, sendo instalada a Presidência da Assembleia Municipal e o Gabinete da Eurodeputada do Partido Socialista.
O edifício, dada a sua importância na história do concelho, da região e do país, deveria funcionar como um monumento temático, direcionado quer para o turismo, quer para a população local, como foi exemplo nestes últimos dias durante o Mercado Quinhentista.
É pois chegado o momento, no meu entender, de colocar estes dois edifícios na primeira página da história da região, e não no seu rodapé, como tem acontecido, valorizando assim o seu património edificado e toda a sua rica história.