Jaime Gomes
Jaime Gomes
Vogamos a plena vela para o fim de mais um ano… viagem, não em jangada de pedra, mas numa ilha verde flutuante e plena de vida.
Essa ilha com as raízes lassas presas à Jangada de Pedra que José Saramago tão bem retratou no seu livro com o mesmo nome. Depende do vento, agora sim que trago bonança e brisa leve e quente, agora não que me empurras com essa ventania de não levantar voo. É esse o preço a pagar para viver no paraíso, nem sempre aterramos e voltarmos à jangada de pedra é sempre uma complicação.
Vistos da jangada de pedra e mesmo apesar das nossas verdes raízes, devemos podemos parecer a quem interessar mais um bote à deriva, que uma ilha. Diz quem sabe que na jangada de pedra há uma empresa, dessas que fazem a limpeza obrigatória de terrenos e matas, contratada para ir cortando as nossas raízes à jangada de pedra. Será que ficaremos à deriva?
De facto, derivamos muitas vezes, não pela nossa vontade própria, mas pela vontade da Natureza.
Sou defensor acérrimo do nosso arquipélago, pela singularidade de quem somos, como somos e de como sempre tivemos a certeza de, por onde quisemos ir. Sou ainda mais defensor do Norte da nossa Ilha, pela enorme força, saber estar, e vontade de vencer que as nossas gentes emprestaram desde o início ao caracter desta ilha.
De facto, se a brutal beleza do Norte, foi peça essencial da construção da imagem de um arquipélago único e imaculado, o caracter das suas gentes não o foi menos. A força humana da nossa paisagem confunde-se a miude com a da sua Natureza. Uma alicerça na outra e ambas unidas para criar a misticidade da Ilha dos Amores do grande Camões.
O que outrora foi tão querido e único perdeu-se nos tempos, nas terras de outras conquistas…mais quentes, mais vastas, mas também mais perdidas. Nós, fomos ficando, emprestamos a grandes nações o brinde de povo livre. Emprestamos a outras, o nosso espaço para que de outras distantes terras se habituassem ao espaço europeu.
Marcamos tantas vezes a diferença entre a vida e a morte, numa fronteira indefinida, invisível e fomos nós próprios tantas vezes invisíveis, para dentro e para fora.
O mar que nos abraça e nos acolhe, faz-nos parecer perdidos nessa imensidão do amplexo marítimo.
Nunca vogaremos, as vagas procelosas sem rumo, as mãos calosas do povo arquipelágico nunca o permitirão. Seremos sempre Ilha dos Amores, nunca nau sem rumo.
Seremos sempre unos, irmãos numa comunhão de valores entre Norte e o Sul, entre o Mar e a Serra, destino comum deitado nas sortes dos homens e mulheres desta ilha.
Nunca poderia advogar em prol da Ponta Delgada, sem antes reconhecer todas estas dimensões que se refletem no que fomos, somos e queremos ser no futuro. A dimensão mística na imagem refletida da Ilha dos Amores camoniana que cada madeirense tem da sua própria ilha. A dimensão histórica da ilha e do seu lugar primeiro no contexto das descobertas portuguesas. E a mais recente, a dimensão europeísta do nosso pequeno espaço como elo de ligação entre as américas, África e o espaço europeu.
Somos e seremos sempre porta de partida e chegada, janela para um horizonte largo e espectral. Seremos sempre embaixadores de nós próprios e dos outros que nos emprestaram um pouco da sua alma.