Rogério Gouveia Fernandes
Rogério Gouveia Fernandes
Steve Bannon esteve este ano de visita à Europa e fez-se notar em alguns comícios em Paris, junto de Marine Le Pen, assumindo-se também ele fã de Matteo Salvini. Entre os seus caprichos e devaneios está a criação de uma base extremista em Itália (ao que parece, e segundo consta, num mosteiro do século XIII, ou algo que o valha…)
Falo do mesmo senhor que terá tido um papel decisivo na eleição de Donald Trump (enquanto chefe executivo do “assalto” à Casa Branca), ex-director da publicação online Breitbart News (de extrema-direita) e homem por detrás do mediático escândalo da Cambridge Analytica. Sobressaem ainda conexões obscuras a uma série de entidades, ligações empresariais controversas e motivações políticas sombrias (tudo isto alegadamente, claro está…).
E é muito “fácil” aceitar as ideias de um populista. Acreditem. Que apresentará sempre soluções e respostas simplistas e escaganifóbéticas para probelmas complexos e estruturais (construímos um muro e pronto; expulsamos os refugiados e…voilá!). Yanis Varoufakis dizia num podcast qualquer da BBC que: “Se não estás confuso quando confrontado com um assunto confuso, então só podes ser fanático!”. E eu não podia estar mais de acordo.
E são precisamente estes excelentíssimos senhores, populistas convictos (encabeçados por Bannon, Salvini, Le Pen, Orbán e mais meia-dúzia de iluminados das redes sociais e peritos da engenharia social) que nos querem “fazer a cabeça”, e que nos convidam, de forma quase subliminar, a participar em movimentos extremistas. Por outro lado, numa outra frente, mas não menos importante, surge o fenómeno das fake news: ingrediente secreto e essencial nesta mistura fatal e explosiva. E esta tempestade perfeita, claro está, será quase sempre alimentada pela ignorância e instigada pelo ódio e pelo imediatismo.
‘Não acreditar em tudo o que se lê’ e ‘Confirmar as fontes’ devia fazer parte da primeiríssima lição em Educação Digital. E o uso do senso comum devia igualmente ser uma prática comum e altamente recomendada. Os polígrafos e o fact-checking (invenção mais recente da sociedade de informação) surgem assim por necessidade, e de mansinho, para tentar decifrar as mensagens ou aferir a veracidade dos factos (demasiadas vezes, até, difundidos por órgãos de comunicação que deviam ser de referência).
E nós, meros utilizadores de “candy crashes”, “facebukes” e “instagrames” desta vida, não somos mais que reles cobaias nesta colossal experiência social e comportamental, feita de partilhas, “engajamentos” e visualizações internéticas. Aqui os números é que contam. E os likes e shares que resultam dos nossos queridos posts, fazem-nos mesmo acreditar que afinal temos a razão do nosso lado. Uma validação perigosa, estúpida e perversa, que alimenta os egos e afaga-os, fazendo crescer inclusive este falso e momentâneo poder de mudar o mundo (quase de modo literal, diria eu)
Primeiro encontramos a cura para o Cancro na água morna com limão ou no concentrado de Aloe Vera; depois vemos abaladas as nossas crenças quanto ao formato esférico da Terra, e…finalmente: metemos aquele like gostoso, respiramos fundo, partilhamos, e sorrimos como patetas, ignorando os princípios mais básicos e primários da Ciência.
Às pessoas não lhes apetece pensar. É um facto. E as redes sociais (e o facebook em particular) é o reflexo disso mesmo. A urgência do momento e a procura de soluções milagrosas, leva-as a surfar ainda esta onda de populismo e de ódio. Uma verdadeira “onda da Nazaré”, arriscar-me-ia a dizer. Daquelas que precisas de “tê-los no sítio” para enfrentar. Ou ainda uma espécie de Brexit (no campeonato das ondas gigantes), onde muitos se encontram no “tubo” sem saber bem como, fruto igualmente de uma onda de euforia colectiva que poderá acabar de forma trágica contra uma arriba. “Orgulhosamente sós” e desamparados, com um Nigel Farage a assistir ao derradeiro espetáculo a partir do farol, impávido e sereno, e com um ligeiro friozinho na espinha.
Pode até parecer romântico e utópico, mas ainda acredito que os meios rurais da Madeira são preciosos microcosmos, e devem portanto ser preservados. No Arco de São Jorge (apenas para particularizar), a Educação Digital junto da terceira idade e das classes menos letradas devia ser uma prioridade, realizada até de forma informal por profissionais preparados e conscientes (com uma dimensão igualmente técnica, cívica e comunitária). A nossa escala ainda o permite, e o fardo do isolamento até pode jogar a nosso favor, evitando mesmo o perigo de “contágio”.
E a boa educação (já no sentido mais lato), devia igualmente ser incentivada e perpetuada. Pequenos gestos como um “bom dia” e uma “boa tarde”, (ou mesmo um mais arcaico “com a sua benção”), são certamente soft-skills que nos deviam servir para enfrentar o mundo com uma motivação maior, preparando-nos para abraçar uma realidade que muitas vezes é crua, cruel e adversa, mas onde o respeito devia ser algo sempre presente e transversal.
A minha mãe podia até ser um caso de estudo. Depois dos 74 anos, e sem o ensino básico completo, aprendeu a usar o facebook, fazendo um perfeito contraponto com a vida real. Duvida até dos “conhecidos” e não aceita qualquer um no seu círculo de amigos. Mal sabe o que é um like ou um post, preferindo as mensagens escritas, escorreitas e com significado, aos emojis e gifs estéreis e estilizados (que apelida carinhosamente de ‘bonecos’). Tem apenas 34 amigos naquela rede social mas conhece-os a todos, e quando não conhece ou tem dúvidas acerca da sua origem, elimina-os (ou pede para “desamigá-los” com efeitos imediatos).
Volta e meia até participa em correntes do Messenger (é certo), o que a “obriga” a re-enviar uma Nossa Senhora com néons, luzes psicadélicas e cores aberrantes para pelo menos 5 pessoas, sob pena de ter uma péssima semana. Mas enquanto não disseminar mensagens de propaganda, ódio e contra-informação, com suásticas bem marcadas, títulos em bold e fundos em dégradé, até nem estamos assim tão mal…