Rogério Gouveia Fernandes
Rogério Gouveia Fernandes
Portugal, em 2003, seria dos primeiros países a introduzir o trabalho remoto (ou teletrabalho) no seu código laboral.
Mas foi preciso o Covid entrar em cena de rompante (qual bicho papão enfurecido!) para pôr à prova esse modelo tão negligenciado, justificando finalmente a sua aplicação (volvidas quase duas décadas).
Nada de novo, portanto, para um país que não é propriamente conhecido por ter uma evolução rápida, sustentável e consistente, e agarrado como uma lapa aos modelos mais tradicionais. Da teoria à prática normalmente vai uma distância considerável, e não raras as vezes perdemo-nos mesmo pelo meio, com teorizações, estudos de impacto, pareceres e orçamentos…
Certo é que, segundo estudos recentes (!), parece que há a destacar melhorias na produtividade e no desempenho, após a adopção do “famigerado” teletrabalho neste annus horribilis. Duas métricas pelas quais Portugal nunca esteve nas bocas do mundo, ou seria sequer motivo de citação ou burburinho nos corredores de Bruxelas.
No norte da Madeira, e nas zonas mais rurais em particular, a mudança de paradigma na forma de trabalhar (ainda que lenta, incerta e algo esquizofrénica) pode mesmo constituir uma oportunidade. O deslocamento de profissionais para o campo não é de todo descabido (e já se afigura como uma tendência). E a qualidade de vida, quando comparada com a dos centros urbanos, pode mesmo fazer mudar a opinião dos mais cépticos. As vantagens são inegáveis: habitações mais baratas, ausência de trânsito ou filas de espera, e vasta disponibilidade de espaços para actividades de lazer e ar livre (só para enumerar alguns exemplos).
Mas um ambiente pautado pelo sossego e pela tranquilidade (e por vezes a roçar a pasmaceira) podem não ser trunfos suficientes para aliciar estes profissionais. As próprias populações e poder local devem por isso estar preparados para receber estes “nómadas digitais” e demais profissionais dos novos tempos. Seja através de espaços de co-working ou co-living em meio rural, Cafés adaptados a esta realidade, internet de banda larga e acessível, ou opções de mobilidade concretas e eficientes (formando assim comunidades dinâmicas e activas, funcionando em rede e criando sinergias).
O impacto ambiental positivo, o estímulo do comércio local e de uma agricultura mais sustentável, com a consequente redução da pegada ecológica, serão outros dos motivos para atrair um público cada vez mais atento e igualmente preocupado com esta realidade.
Quebrar a espiral de desertificação e esquecimento destes espaços rurais, valorizando as populações mais vulneráveis (mas nem por isso menos capazes), torna-se assim uma batalha menos desigual, onde os grandes centros urbanos quase sempre levam a melhor.