A freguesia da Sé é a mais pequena do Funchal, em área e população, mas tem pormenores que a tornam um caso único. Desde logo o facto de incluir no seu território as Ilhas Selvagens, o ponto mais a Sul de Portugal e por ser atravessada, diariamente, por muitos milhares de pessoas. Madeirenses e ainda mais turistas atravessam a baixa da cidade, para trabalhar, fazer compras e visitar alguns dos pontos mais turísticos do Funchal.
A Sé tem pouco mais de 3.000 eleitores, mas tem uma grande densidade de pessoas. As lojas da baixa, o Parque de Santa Catarina e o Jardim Municipal, toda a Avenida do Mar e zonas mais habitacionais como a Rua dos Ilhéus, a Avenida do Infante e a Penha de França, as pequenas ruas do centro a Rua Fernão de Ornelas, a mais movimentada do Funchal, completam o quadro mais visível de uma freguesia que também tem outras imagens.
É na freguesia da Sé que se encontram mais pessoas em situação de sem-abrigo e mendicidade, mas também idosos que vivem isolados, alguns com dificuldades. Uma pobreza envergonhada que contrasta com a ideia de que esta é uma freguesia de ‘gente rica’.
É também na Sé que encontramos muito alojamento local e uma densidade automóvel que já se tornou a imagem de marca do Funchal.
Falar com o padre é uma das melhores formas de conhecer uma freguesia. O cónego Marcos Gonçalves é o pároco da Sé, um dos cargos mais destacados da Diocese do Funchal, mas não por isso que conhece menos a sua freguesia.
Questionado sobre a situação de pessoas sem-abrigo mesmo à porta da catedral, reconhece que é um problema, mas recomenda uma comparação com outras paragens.
“Sou uma pessoa pouco viajada, mas conheço várias capitais e já vivi em Roma e não há como a nossa cidade do Funchal. Às vezes é preciso sair. Como somos uma ilha, estamos num meio pequeno, às vezes as ganham uma proporção grande quando às vezes são coisas simples e não damos valor às coisas positivas. Se formos às cidade de Roma, vamos ver o que é lixo, pobreza, turismo misturado, trânsito caótico e poluição”.
A Sé, diz, é “uma freguesia bonita, pequena em território, com 6 mil habitantes” e a paróquia “tem uma boa colaboração e vivência com a junta de freguesia porque somos pequeninos e próximos”.
Marcos Gonçalves não minimiza o problema dos sem-abrigo, mas lembra que “se formos a outras catedrais e igrejas, pelo mundo fora, não imaginam a pobreza que há. Existem tendas, sacos de cama, esponjas em cada esquina”.
Um problema que, para ser resolvido, exige “um esforço de toda a sociedade, em várias facetas do cuidado humano, para olhar por estas pessoas. Se o problema fosse fácil de resolver já estava resolvido”.
Também o turismo, que nos últimos tempos tem sido contestado pelo excesso de visitantes, não pode ser visto como um problema.
“Mais uma vez, dou o exemplo de Roma. Quem entra numa igreja vê o que é o turismo em massa, a igreja quase que perde a sua dimensão de lugar de oração e silêncio. A nossa igreja é o maior monumento da Região e penso que todos os turistas passam pela Sé”.
Embora a zona mais habitada seja a dos Ilhéus “e aí vive a classe média e média alta”, há muitos casos de pessoas que vivem em casas antigas.
“O alojamento local foi bom porque veio reabilitar prédios muito antigos que, se não fosse por isso, estavam completamente a cair aos bocados. Isso trouxe uma dinâmica importante”, reconhece.
No entanto, numa freguesia com muitos idosos, há situações que exigem mais atenção.
“A junta e a segurança social fazem um trabalho muito bom. de atenção à pobreza envergonhada, e a paróquia também procura fazer o seu trabalho”, assume.
A paróquia procura reorganizar a nossa acção caritativa para ser mais sistemática. “Visitamos os doentes, mas também é importante visitar outras pessoas que estão sozinhas. Pessoas que têm uma lâmpada queimada, o fogão estragado e não sabem resolver e temos de arranjar formas de a paróquia poder ajudar”.
Uma pobreza envergonhada, agravada pela solidão. “A maior atenção é aos idosos, a solidão faz com que a pessoa esteja fragilizada e não consiga fazer um telefonema, tomar medicamentos a horas certas… Há dificuldades em pagar a renda, pagar uma conta e a capacidade da igreja é pontual”.
O estacionamento é outro problema no Funchal que, em princípio, não deveria afectar o pároco da Sé. “Nós temos dois lugares de estacionamento reservados que diariamente são abusivamente ocupados. Eu acho piada as pessoas dizerem que não querem mais estacionamentos para não trazer mais carros para a cidade e depois estacionam no lugar do padre”, protesta com um sorriso.
Estacionamento que, assume, pode ser subterrâneo, como acontece “em todas as praças do Porto” e poderia ser no Largo do Colégio.
“Não querem estacionamento subterrâneo [no Largo do Colégio], mas põem os carros em cima”, ironiza.