Elisa Seixas
Elisa Seixas
«Nenhum jovem pode ficar satisfeito ou chegar ao topo de uma carreira se tiver na cabeça um horário de trabalho das 9 às 17 horas ou de segunda à sexta. Esqueçam.» Cito o vice-presidente do Governo Regional, Dr. Pedro Calado, num encontro com jovens desempregados/as, em Câmara de Lobos. Bem sei que o encontro não foi com jovens de São Roque mas suponho que, se fosse, o conselho seria idêntico.
Numa região turística, como é a nossa, a afirmação não me parece descabida, muito embora um bocadinho exagerada. É que os horários de trabalho devem ser decididos de forma concertada com todas as partes envolvidas, tendo em conta as necessidades dos diferentes setores. Obviamente que no setor da hotelaria e restauração, não é novidade para ninguém que o horário de trabalho não é, obviamente, idêntico ao do setor da prestação de serviços públicos, que obedece a outras necessidades.
No entanto, estas necessidades dos vários setores deverão ser secundadas com as condições necessárias para que as pessoas que tiverem de cumprir esses horários possam de facto fazê-lo. E um dos entraves a essa boa vontade, abertura e ambição dos e das jovens trabalhadoras passa pela oferta de transportes públicos.
Tenho alunos e alunas prestes a entrar no mercado de trabalho. Em muitos casos, e porque a vida não é fácil, já o fazem em regime de part-time – ou pelo menos tentaram fazê-lo, acabando por desistir por razões que escapam à sua vontade. É que o problema da mobilidade não se põe apenas ao nível da Região relativamente ao Continente.
Volto às zonas altas de São Roque, nomeadamente o Galeão, para exemplificar o meu argumento de que é preciso criar condições para que as pessoas possam cumprir horários «fora-de-horas». Em termos de transportes públicos – e há muitas pessoas, principalmente as mais jovens, que não têm transporte próprio – a oferta não tem em conta essa necessidade de se querer chegar ao topo; a carreira 93 dos Horários do Funchal que serve o Galeão, oferece o seguinte horário aos seus clientes: o primeiro autocarro do dia sai do Lombo do Jamboeiro às 7:10, sendo que o último é às 21:25. Aos fins-de-semana, aos sábados a última carreira acontece às 15:20, ao domingo às 14:20. Se pensarmos que esta carreira faz Lombo do Jamboeiro – S. Roque, um trabalho no centro do Funchal ou em outras freguesias da periferia (penso, por exemplo, em S. Martinho, onde fica uma grande parte das unidades hoteleiras), implica muitas vezes ter de apanhar outra carreira. Percebe-se a dificuldade que as pessoas do Galeão têm, em termos de mobilidade, em cumprir os tais horários absolutamente necessários ao sucesso e, portanto, de chegarem ao topo das suas carreiras. Na verdade, a dificuldade põe-se até em conseguir começar essa carreira. Até mesmo no setor do comércio e do retalho, cada vez há mais horários que implicam trabalhar aos fins-de-semana, até muito depois da última carreira disponibilizada pela empresa de transportes públicos. Basta pensar nas cadeias de supermercados, centros comerciais e outros serviços.
Seria, pois, importante, repensar a oferta à população da freguesia, a fim de que as pessoas das zonas altas de São Roque possam ter condições para ficarem satisfeitas e chegarem ao topo das suas carreiras. A questão não é, portanto, as pessoas adaptarem-se aos novos horários de trabalho; a questão é se os Horários se adaptam aos novos horários de trabalho das pessoas e cumprem o que se espera de um serviço público.