Muitas vezes passamos por interessantes elementos da nossa arquitetura popular e não nos apercebemos do quão interessantes podem ser e a riqueza patrimonial que encerram!
Refiro-me aos remates de telhado, elementos figurativos colocados nas extremidades dos beirais das casas e que constituem uma importante referência da nossa arquitetura popular, bem como do património material e imaterial regional. Subjacente à sua colocação nos beirais ou cumieiras dos telhado encontra-se uma crença de proteção da família, tendo o remate a função simbólica de afastar os maus presságios, assumindo o papel de figura protetora do lar e de quem nele habita, numa reminiscência de rituais de superstição e sinais ligados ao culto pagão, como refere nas Ilhas de Zarco, Eduardo Pereira.
Tratam-se de pequenos objetos em barro ou argamassa que inicialmente eram moldados à mão, pelos oleiros, mas com a crescente procura, passaram a ser elaborados em série, a partir de moldes em gesso nas olarias . Figuram nas casas madeirenses a partir de finais do século XIX e ao longo do século XX, caracterizando a arquitetura regional vernácula. Nos finais do século XX encerrou a última olaria da Madeira, a Antiga Olaria do Lazareto, terminando assim um conjunto de experiência e saberes que na singularidade das peças encerram memórias e histórias de vida!
Podemos encontrar remates de telhado espalhados praticamente por toda a ilha e são inspirados nos mais variados géneros, tais como: figuras antropomórficas, e fitomórficas, naturalistas ou estilizadas, como pombinhas de asas abertas, pombinhas de asas pousadas, cabeças de gatos, cabeças de cães, cabeças de meninos com chapéu, cabeças de fidalgo, pontas de seta, conchas, folhas de acanto, papagaios …e grifos ou dragões!
E é precisamente sobre um grifo que me vou reportar!
A minha casa possuía quatro raros exemplares de remates de telhado…dos quais apenas resta um num dos beirais da fachada lateral da casa. Representa um grifo…mas desde pequena que sempre olhei para ele como um dragão.
Já em criança e adolescente mostrava gosto e interesse pelo passado e pelo património…e recordo-me perfeitamente que foi com muita presunção que num roteiro sobre o património do concelho da Calheta, da autoria dos professores Elisa Brazão e António Castro, publicado em 1993, pela Câmara Municipal da Calheta, a fotografia do nosso remate vinha na capa…aí então me apercebi da raridade do remate que tínhamos em casa! Cheia de orgulho mostrava essa publicação onde figurava o remate de dragão da minha casa de família!
Podemos encontrar remates de telhado espalhados praticamente por toda a ilha e são inspirados nos mais variados géneros, tais como: figuras antropomórficas, e fitomórficas, naturalistas ou estilizadas, como pombinhas de asas abertas, pombinhas de asas pousadas, cabeças de gatos, cabeças de cães, cabeças de meninos com chapéu, cabeças de fidalgo, pontas de seta, conchas, folhas de acanto, papagaios …e grifos ou dragões!
Anos mais tarde participei num interessante projeto da ARCHAIS – Associação de Arqueologia e Defesa do Património da Madeira (ARCHAIS), que através de uma candidatura ao programa Líder +, realizou um programa experimental de recuperação e valorização dos remates, na freguesia de Gaula. Foi uma forma da comunidade passar a observar com outros olhos estes elementos figurativos.
Voltando ao grifo/dragão, mais recentemente o mesmo surgiu referenciado no livro de Paulo Ladeira, “Calheta e Património-uma abordagem” numa interessante edição da Câmara Municipal da Calheta. Sobre a mesma obra, foi realizada uma reportagem tendo como pano de fundo a nossa casa e o nosso dragão…motivos que muito me orgulham atendendo a que nos últimos vinte anos o gosto e a divulgação do Património tem sido uma constante na minha vida profissional.
É uma grande satisfação possuir uma casa de família com um elemento figurativo tão peculiar como é este grifo/dragão…desejo que na sua função protetora este continue a acompanhar o nosso lar e quem nele habita!