Catarina Silva
Catarina Silva
Existe no Funchal um coração que se enche de gentes que palpitam histórias de anos de vida. Existem vidas que se enchem de histórias num recanto territorial em forma de coração, chamado carinhosamente de “Imaculado”. Nele, são muitas as artérias que fervilham de vida.
No verde da zona mais alta, ouvem-se balidos de ovelhas que se demoram entre a erva e os carros que passam. Um pouco abaixo, num ritual diário de amor e paciência, um avô auxilia o neto nos seus primeiros passos, num passeio matinal em frente ao portão de casa. E o dia amanhece ao som dos melros pretos, um chilrear que se dilui lentamente com o som dos carros, das vozes que aquecem com um “Bom dia”.
A freguesia ganha cor e palpita.
Fixaram-se gentes de todas as partes da ilha, gentes que trouxeram pregadas à pele a sua identidade e cultura. Com elas, as encostas do Imaculado Coração de Maria enriqueceram-se de tradições e sabedoria, daquela que não vem nos livros nem passa na televisão.
Os laços estreitaram-se, as comunidades fortaleceram-se.
Numa das artérias que dilata este coração, vivem as gentes das Lajes que, num exercício de resiliência, calcorreiam a rua para cima e para baixo. Trazem com elas a generosidade do tempo, a cadência de uma conversa que necessita ser feita entre fôlegos. Um “olá”, um “está tudo bem?”, um desenrolar de histórias e um peito aberto para as ouvir. No sítio das Lajes juntam-se tradições e fazem-se festas, arraiais e convívios. E todos os braços se abrem em boas-vindas.
A tarde traz consigo novos ruídos, vozes de juventude que saem das escolas e que, entrosadas em conversas entusiasmadas, regressam a casa. Retornam também as gentes, que enchem os cafés de vida e desabafos sobre o dia.
A luz diminui.
Anoitece ao som das rãs e dos gatos que despertam para a vida, e o coração palpita quase em surdina.
Existe no Funchal um coração, de seu nome Imaculado.