A possível prática de crime de burla envolvendo a propriedade da antiga sede da Junta de Freguesia do Imaculado Coração de Maria (JFICM) promete ‘incendiar’ a sessão da Assembleia de Freguesia convocada para esta tarde.
No cerne da polémica está uma proposta do executivo, coligação ‘Funchal Sempre à Frente’ (PSD/CDS) de ‘renovação do acordo’ com o Governo Regional (GR) para a cedência temporária do espaço no edifício Cuibém onde, no passado, funcionou a sede da Junta de Freguesia.
A maioria invoca uma acção judicial intentada pelo GR contra a JFICM para a entrega da fracção no referido prédio urbano que foi sede da Junta entre 1994 e 2019. Argumenta também que a Assembleia de Freguesia do Imaculado Coração de Maria (AFICM), em Setembro de 2011 (PSD), reconheceu que “a sede da Junta é propriedade da RAM” e que a mesma fora “cedida, a título precário”. Decisão tomada dois meses após ter sido publicado no JORAM na sequência de deliberação tomada em Conselho de GR “ceder, a título precário, pelo prazo de 20 anos, prorrogáveis por iguais períodos, à JFICM, para suas instalações”, a fracção em causa localizada na Rua 31 de Janeiro, Rua do Til e Rua Nova da Quinta Deão.
O actual poder local lembra ainda que em Maio de 2019 os serviços administrativos da Junta de Freguesia foram deslocalizados para a actual sede da autarquia, na Estrada dos Marmeleiros, para concluir que a JFICM “nunca instruiu nem poderia ser bem-sucedida num processo tendo em vista a defesa da posse e o reconhecimento da aquisição” dada a sua condição de possuidor precário. Para a maioria PSD/CDS “é ainda imoral que a JFICM se tente apropriar de um espaço que lhe foi cedido, de boa-fé, pelo GR”, expressa no fundamento da proposta a ser hoje discutida e votada.
Acontece que o socialista Gonçalo Aguiar, ex-presidente da Junta, descobriu elementos que indiciam “negociata” com o objectivo de “legitimar que o GR é dono daquilo”.
Tudo porque em 1991, correspondendo à proposta do construtor do edifício de 8 pisos e 31 fracções, a Câmara Municipal do Funchal (CMF) autorizou a construção do prédio no gaveto Norte da Rua 31 de Janeiro com a Rua do Til (cedendo parcela do município) sob a condição de “permuta” da área edificada do R/C no respectivo lote de terreno a ser entregue à JFICM (área de 96 m2), juntamente com área de armazém na 1ª cave (55 m2). Em contrapartida o promotor beneficiou de isenção parcial do pagamento de licenças e facilidades de vazadouro na proximidade do local da obra.
Inaugurado em 1994 num dos primeiros actos públicos de Miguel Albuquerque na presidência da CMF, no documento constituição de propriedade horizontal consta a instalação da JFICM, só que, entretanto, as partes ‘esqueceram-se’ do registo de propriedade.
O volte-face começou em 2008, com a falência do promotor do edifício Cuibém, por dívidas fiscais superiores a 71 mil euros. Para pagamento das dívidas em execução fiscal a sociedade faz a dação da totalidade da fracção que tinha atribuído à JFICM, com o valor patrimonial tributário de quase 111 mil euros.
Foi na sequência deste auto de dação em pagamento feito à Direcção Regional dos Assuntos Fiscais que o GR chama a si, em 2011, a titularidade da fracção onde então funcionava a JFICM.
Por considerar haver indícios da prática de crime de burla agravada, o caso foi, entretanto, participado ao Ministério Público pelo anterior presidente da Junta, o socialista Gonçalo Aguiar. O autarca agora na oposição promete não facilitar o que classifica de “tentativa de legitimar e abafar uma negociata em prejuízo da Junta”, referindo-se à proposta a ser votada hoje. Fica ainda o aviso que “o PS vai continuar a seguir todo este processo e procurará garantir que isto não fique no esquecimento”.